O Cambirela é uma montanha localizada no município de Palhoça, região metropolitana de Florianópolis. Possui 1052 metros de altura e por estar próximo ao mar, propicia um visual magnífico, incluindo a barra sul e boa parte da Ilha de Santa Catarina.
Por muito tempo ele foi um importante ponto de referência, pelo destaque que tem na geografia da região. Em uma obra do artista catarinense Victor Meirelles, de 1847 é possível notar esse destaque.
Como nossa família mora no Sul de Santa Catarina e a estrada passa no pé do Cambirela, toda viagem conversávamos com as crianças sobre como seria o visual lá de cima: qual a altitude, quantos quilômetros de subida e percebíamos o sonho coletivo de chegar ao topo desse gigante.
A origem do nome
Uma das dúvidas dos pequenos era o significado do nome Cambirela. Descobrimos que este nome vem do tupi-guarani e significa muitas mamas (kambi = mama; reya=multidão). Não vimos muito sentido nesse significado, pensando que poderia ser grande mama, devido ao formato do Cambirela(repare nas fotos). As crianças propuseram muito leite, porque do Cambirela partem muitos rios que, por sinal, formam belas cachoeiras. Mas quem sabe um dia não passamos na tribo indígena que fica ali perto e perguntamos diretamente ao povo guarani.
Preparativos
Juntos estudamos a distância e as principais dificuldades. São aproximadamente quatro quilômetros da base ao topo, sendo o primeiro terço da subida de grau leve, o segundo muito íngreme e com partes de escalaminhada em raízes e pedras. Estas duas partes são feitas sob a exuberância da Mata Atlântica. A parte final é uma subida um pouco menos íngreme através de vegetação típica de altitudes maiores. Depois, a volta, descendo estes quatro quilômetros, fechando em cerca de 8 quilômetros.
Todos estávamos cientes que este seria o nosso maior desafio até então. Mas as crianças toparam.
Fazer essa pesquisa junto com as crianças é algo que os estimula a entender os benefícios que teremos se atingirmos o objetivo e quais as dificuldades que serão enfrentadas. Com essas informações os pequenos conseguem enxergar quais as ações serões necessárias e juntos desenvolvemos um planejamento.
Com o objetivo em mente, definimos uma estratégia, fazer exercícios de fortalecimento muscular e cardiorrespiratório. Sabíamos que o Parque do Tabuleiro, onde fica o Cambirela, estava fechado por conta da pandemia, então estávamos cientes que teríamos tempo para nos preparar.
Papai intensificou os exercícios de pernas na academia para poder aguentar os 20 quilos da pequena Laís, de seis anos, nas costas.
Mamãe no Pilates também focou no fortalecimento geral, porque sua mochila também iria mais pesada, além de ser uma grande subida.
E todos definimos que iríamos fazer duas caminhadas durante a semana, de no mínimo cinco quilômetros e preferencialmente com trajetos que previssem muitas subidas. Moramos na área continental de Florianópolis (sim, Floripa não é só a ilha!!!), no bairro Coqueiros, que possui muitos morros, então nossos treinos eram perto de casa. As crianças às vezes tinham preguiça, mas com o objetivo em mente não esmoreceram. Além disso, as trilhas que fazemos com frequência também foram parte do preparativo.
Também conversamos com os pequenos sobre a alimentação e hidratação necessárias. Decidimos que almoçaríamos no topo e faríamos um lanche na subida. Para o lanche, levamos maçãs, banana seca e bolachas. Para o almoço, preparamos sanduíches de salame e queijo polenguinho (pois não precisam de refrigeração). As crianças pediram sobremesa, então levamos doce de leite em barra e MMs (porque é um chocolate que não derrete). De água, levamos 9 litros.
As trilhas
Finalizando o planejamento, fizemos o levantamento das trilhas. Existem no mínimo duas maneiras de chegar ao cume do Cambirela, decidimos fazer a rota que tem início no KM 222 da BR 101, logo após o posto Cambirela. O papai já tinha feito a trilha em 2018, mas como o Parque do Tabuleiro estava fechado a mais de um ano por conta da pandemia, temíamos que a trilha estivesse mais fechada, tomada pela floresta. Utilizamos o aplicativo Wikiloc, baixamos a trilha no celular para termos o roteiro em caso de perda de sinal.
Assim que o parque abriu suas trilhas novamente, marcamos a data.
Nossa jornada
Para esta aventura tivemos um companheiro de jornada, o irmão da mamãe, tio Lelo, então havia a segurança de mais um adulto acompanhando.
Deixamos o carro num local onde antigamente existia um estacionamento, atualmente fechado por estar em uma unidade de conservação. Muitas pessoas preferem deixar o carro no Posto Cambirela, um pouco antes, o que aumenta um pouco a distância a ser percorrida a pé.
Iniciamos a trilha pouco antes das 7 horas, ainda estava começando a clarear, era julho e estava frio. A trilha é bem aberta e não existem muitas bifurcações onde é possível se perder. Esse primeiro trecho passa por áreas com muitos pínus e aos poucos a Mata Atlântica vai surgindo com todo seu esplendor. Após aproximadamente 1,5 km do início da trilha há um rio, muito bonito, mas que indica também o fim da moleza, dali em diante a subida fica bem mais íngreme.
Essa segunda parte, por trechos de Mata Atlântica bem preservada, requer muito preparo físico porque em vários locais há necessidade de uso das mãos para agarrar em raízes ou pedras. Alguma boa alma colocou grampos para facilitar a subida nos trechos mais difíceis. Durante esta parte tiramos os casacos porque o calor aumentou.
Como já imaginávamos, as crianças precisaram de muitas paradas, para tomar água e descansar. Como já tínhamos combinado com eles, pararíamos sempre que eles pedissem. Confessamos que tínhamos que controlar a ansiedade, porque foram muitas paradas mesmo.
A última etapa começa no local conhecido como acampamento, pois é um local onde é possível acampar antes de chegar ao cume. É basicamente uma subida mais fácil que a anterior, por uma vegetação mais baixa, portanto expostos ao sol. Apesar do cansaço enorme, como é possível visualizar o objetivo, parece que há uma injeção de ânimo, e esta etapa é feita com entusiasmo. Como havia muito vento, o frio voltou e tivemos que recolocar os casacos.
Chegar ao cume foi uma sensação indescritível, um misto de satisfação com a vitória e deslumbramento com a beleza do lugar. Curtimos muito, tiramos muitas fotos e vídeos. Almoçamos e comemos as sobremesas. Lá no cume tem um livro, onde os conquistadores do cume podem colocar seu nome, a Família na Trilha tem seu nome marcado com orgulho. Como paramos de nos movimentar o frio aumentou, ainda bem que estávamos preparados. Ao todo ficamos uma hora lá em cima, e como era uma segunda feira, não havia mais ninguém, curtimos aquele visual sozinhos.
Começamos a descida, a primeira parte, mais aberta, tem o solo mais seco e é um pouco escorregadia, mas tranquila. A segunda parte nos surpreendeu muito. A descida é extremamente difícil, principalmente para o papai que estava com a Laís nas costas. Como a descida é muito íngreme, todo cuidado é pouco para evitar quedas e possíveis ferimentos. Para os maiores também fizemos com toda calma e cuidado para evitar acidentes. Já a última parte foi mais tranquila, mas como estávamos muito cansados, parecia que nunca terminava.
Chegamos no carro às 14 horas. Foram sete horas de aventura, um desafio intenso, mas que valeu muito. Ficamos alguns dias doloridos (os adultos), mas maravilhados com o sucesso da empreitada. Com certeza as crianças jamais se esquecerão dessa vitória, da superação dos desafios, do autoconhecimento.
Resumo
Subir o Cambirela definitivamente não é uma atividade para iniciantes. É possível realizá-la com crianças, mas requer muito planejamento, principalmente com a realização de exercícios físicos objetivando o aumento da capacidade cardiorrespiratória. Como tem um alto grau de dificuldade, recomendamos que sempre se vá acompanhado com guias experientes na região.
Komentarze